BIOJÓIAS DE ATAÚRO
Senai Becora |
Fiquei a primeira semana na capital, para me recompor da viagem e conhece melhor o país e também conhecer o local e a matéria-prima. Logo fui para a Ilha de Ataúro que fica a 4 horas da capital, uma viagem linda e uma paisagem espetacular apesar de toda precariedade da embarcação. A ilha é um sonho, com uma natureza inigualável.
Permaneci na ilha por mais três semanas, a ilha é totalmente isolada de transporte até a ilha acontece apenas uma vez por semana, isso se o Mar não estiver revolto.
Na ilha falta de energia, o que tem é através de geradores movido à gasolina. Eles vivem da troca (escambo), motivo este não a dinheiro na ilha.
A critério do Padre Chico foram formados três turmas, totalizando 55 alunos.
A primeira turma formada por jovens secundaristas que vivem na vila e chefes de família que vinham das montanhas.
Na segunda turma formada por mulheres e alguns deficientes auditivos que vivem isolados da sociedade por problemas culturais.
Na terceira turma formada por várias pessoas que vinham do outro lado da montanha, pois tinham que caminhar por mais de três a quatro horas para participarem do curso ou tinham que ficar alojados nas casas de parentes na vila, além de refugiados que vivem hoje na ilha.
Muita dificuldade para a realização do curso.
Como os participantes não tinham nenhuma informação deste tipo de trabalho, foi realizada uma conscientização da matéria-prima, depois a transformação em biojóia, o uso para que e a comercialização com a finalidade de um trabalho de geração de renda.
Com a falta de energia elétrica tivemos a ajuda de um gerador fazendo com que a utilização da furadeira fosse bastante precária, dificultando assim o preparo do material para a confecção das biojóias. Foram improvisadas as bancadas. Tínhamos dificuldade com a linguagem, pois o timorense possui vários dialetos, sendo o mais usado o “Tetum” mesmo com o auxilio de um tradutor, onde ficava cansativo o por que de tudo. Por ser uma cultura diferente tudo que eu falava tinha que explicar e interpretar com muitos detalhes (por que? Pra que? O que é isso?). Mesmo assim, tudo era superado com muitas risadas e muito humor.
Mesmo com o calor de 40º graus, a dificuldade foi se superando com a emoção que os alunos sentiam a confeccionar a sua primeira biojóia (colares, brincos e pulseira), demonstrando uma grande satisfação colocando-as em si mesmo.
Com tudo isso acontecendo, dispertava na ilha uma curiosidade em toda a comunidade que vinham ver de perto o que se fazia ali, então era um entra e si constante.
A cada início de turma se fazia uma caminhada pela ilha para a coleta de matéria-prima, que eram as mais diversas, como: cipós, troncos de arbustos, casca de coco, conchas e caramujos. Cada uma mais linda que a outra.
Os timorenses se sentiam felizes sempre quando citava a beleza e a riqueza que era a ilha, fazendo com que eles se preocupassem com o meio ambiente e começassem a preservar.
As aulas aconteciam no período da manhã e à tarde (9:00 às 14:00).
À noite eu convidava os jovens para aproveitar o gerador do posto médico que ficava próximo, para furar as sementes e preparar a aula para o dia seguinte, era convidado de quatro a cinco jovens, mas sempre vinham mais de quinze jovens e todos queriam participar. Os timorenses se mostravam muito participativo e disciplinado, com muita vontade de saber, todos os trabalhos eram feitos com muita perfeição.
Apesar da dificuldade com o dialeto demonstravam ser muito carinhosos e respeitosos comigo.
Todo o treinamento foi planejado para adquirir todo o conhecimento para uma cooperativa,
Como: coleta da matéria-prima, conservação e manejo, transformação da biojóia, embalagem e a comercialização. Sensibilização para a importância do trabalho em grupo e a responsabilidade de cada um no grupo. Com isso foi elaborado um material didático para que eles pudessem estudar a todo tempo.
No último de aula tivemos um encontro dos três grupos onde pudemos fazer uma avaliação e uma apresentação de toda produção e custo da mesma. Nivelação das informações com os três grupos, onde cada grupo teve que apresentar um trabalho de avaliação do curso. Logo após foi feito a escolha de dois participante de cada grupo para ir até Dili (capital de Timor Leste) para exposição e lançamento do projeto “Biojóias de Ataúro”.
O objetivo dos seis escolhidos a irem até Dili que vivenciarem todo o trabalho de preparação para a exposição e compreender o processo de comercialização e escoação do produto. Foi feito um trabalho com os seis participante que tinham como responsabilidade de repassar tudo para os demais que tinham ficado na ilha. Com a data do lançamento chegando tinha pouco tempo para prepará-los para uma verdadeira gestão de negócios (amostra do produto, marketing do produto, comercialização do produto e como lhe dar com o dinheiro). Durante este tempo fiquei bem próximo dos alunos, pudemos freqüentar restaurantes, visitar lan house, onde pude mostra sites com produtos artesanais (Da Mata Brasil, Sutaco e Artesanato na Rede) e alguns pontos de comercialização de artesanato, como hotéis e lojinhas artesanais.
Nessa mesma semana fui convidado para apresentar o projeto Biojóias de Ataúro ao ministério do meio ambiente, onde os alunos puderam participar dando o depoimento de como aconteceu o projeto e ouviram do senhor ministro que apoiaria a continuidade do projeto. Junto com os alunos fizemos oficinas de biojóias no Senai (centro de formação Becora) no período da manhã foram com os próprios alunos do Senai e a tarde com os internacionais que vivem e trabalham em Dili.
No dia do evento pela manhã os alunos tiveram aulas de como desfilar que iria acontecer durante o lançamento. Onde seria realizado no Café Brasil onde foi oferecido um coquetel pela Embaixada do Brasil em Dili. O coquetel teve início às 17:00 horas, contando com a presença de vários ministros, autoridades e a comunidade internacional. A abertura foi feita com as falas de Rui Soares – aluno cursista, por mim, a Srª Jolanda Butte – Ilo Stage, Srº Antonio José Maria de Souza e Silva - Embaixador do Brasil, Srº Arsênio Bano – Ministro do Trabalho. Logo em seguida tivemos o desfile com os timorenses que orgulhosamente com o traje típico desfilavam com as biojóias. Assim que terminou o desfile tivemos a exposição onde o público pôde tocar e comprar as biojóias.
Tivemos a cobertura jornalística da TV portuguesa “Timor Contato”. O evento teve término por voltas das 23:00 horas, os aluno não acreditavam o que estava acontecendo, já não tinha mais peças para vender e várias encomendas para o futuro. Suas expressões de felicidade me dava alívio de missão comprida e saudade com a partida.
Para mim, este foi um ano especial de longas travessias.
Na volta de Timor Leste ao Brasil, muita coisas ficaram para trás, outras foram despontando.
Por isso, acredito na urgência de reafirmamos nosso valores a cada ano, de resgatar toda a esperança do fundo d´alma, o que nós, educadores sabemos fazer como ninguém! E apesar de tanta incerteza, ter a força de dizer que:o que fizemos pode ter sido pouco, mas valeu apena. Como tudo! Como a vida! E que tentaremos fazer sempre mais, para semear felicidade e algum encantamento.
Carlos da Mata